sábado, 5 de julho de 2014

XIV Domingo do Tempo Comum - ano A - 6 de julho

       1 – «Eu Te bendigo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas verdades aos sábios e inteligentes e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, Eu Te bendigo, porque assim foi do teu agrado. Tudo Me foi dado por meu Pai. Ninguém conhece o Filho senão o Pai e ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar».
       Por certo já nos aconteceu tentarmos explicar um acontecimento, um sentimento, um mistério, procurando as palavras mais adequadas e ficarmos com a sensação que não nos fizemos entender. Quem estava a nossa frente ficou ainda mais confuso, e nós próprios no final não conseguimos também aceder à realidade que queríamos expor.
       Chega alguém, ou até o nosso interlocutor, e de uma forma simples e acessível, usando uma imagem, uma comparação, outra situação do dia-a-dia, diz-nos que e como compreendeu e ajuda-nos a assimilar o que dávamos por adquirido.
       Jesus sublinha a simplicidade do coração para compreender e acolher o mistério que vem de Deus. Os sábios e inteligentes, neste contexto, são todos aqueles que pressupõem que sabem tudo e que não precisam de ninguém para aprender. Os pequeninos são todos aqueles, com qualidades e defeitos, que estão em busca do Céu, em busca do saber, disponíveis para acolher o que vem dos outros, o que vem das alturas e em tudo e todos procuram um sentido, uma lição, um desafio para a sua própria vida.
       Ao mistério de Deus (e do Homem) só acedemos pela humildade, pelo coração. A verdadeira sabedoria será o aceitarmos a nossa limitação e colocar-nos em atitude de contemplação perante o que não compreendemos, sabendo que as palavras são necessárias mas por vezes insuficientes.
       2 – «Vinde a Mim, todos os que andais cansados e oprimidos, e Eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de Mim, que sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanso para as vossas almas. Porque o meu jugo é suave e a minha carga é leve».
       Há acontecimentos que nos desgastam e nos destroem. Sabemos o quanto nos afetam. Há situações, porém, em que nos sentimos abatidos, desmoralizados, esmagados até, sem sabermos as causas e as razões, sejam físicas ou morais, sendo, por vezes, um acumulado de cansaços, chatices, doença, incompreensão dos amigos, solidão, arrelias na família, no trabalho, o clima, sonhos gorados ou expetativas futuras pouco promissoras.
       A sugestão de Jesus é, também aqui, um desafio à simplicidade, ao despojamento, à humildade. Nem tudo nos é desvendado ao mesmo tempo, nem tudo nos é dado a descobrir e a conhecer na forma como esperamos e merecemos. A leveza perante a vida, nada tem de ligeireza. Leva-nos a confiar em Deus, e no futuro com Deus.
       Jesus faz-Se pequenino, absorvendo a nossa fragilidade e finitude, em clara abertura para Deus. E é nessa postura de obediência a Deus, de escuta, que Jesus Se coloca mais próximo de cada um de nós, mais perto da humanidade que nos irmana.
       A sabedoria autêntica passa por aqui. Confiança. Entrega nas mãos de Deus. Ele sustenta a nossa vida e os nossos anseios. A sua carga é leve e o seu jugo é suave, pois baseia-se no amor, na compaixão, na conciliação, para nos libertar do que nos destrói, o ódio, o ciúme extremo, a violência, a inveja, o rancor, o desejo de vingança, a maledicência. São estes propósitos que nos pesam, que nos fazem andar derreados, espiritual e fisicamente. Ficámos doentes quando nos deixamos vencer por emoções e sentimentos destrutivos. Fazem parte da nossa vida, mas há que os relativizar. Definitivo só Deus. Deixar que uma arrelia domine completamente a nossa vida, é permitir que uma ditadura invada o nosso coração, e nos vá matando aos poucos.

       3 – A encarnação, morte e ressurreição de Jesus marca uma profunda alteração na história da humanidade: o Céu abre-se para nós, ficando mais perto, ao alcance da nossa mão e da nossa vontade! A eternidade entra no tempo e faz-Se história. O divino comprime-se para caber no humano.
       Com Cristo já não estamos "sob o domínio da carne, mas do Espírito, se é que o Espírito de Deus habita em nós... Se vivermos segundo a carne, morreremos; mas, se pelo Espírito fizermos morrer as obras da carne, viveremos".
       Ora, é precisamente o chamamento de Jesus: vinde a Mim todos vós que andais cansados e oprimidos por tantas preocupações e por vezes sem razões de maior. Vivei segundo o Espírito, como Filhos e não como escravos. Eu liberto-vos para a vida, para o amor, para o bem. Vinde, benditos de Meu Pai. Abri o vosso coração, esvaziai-vos do que vos destrói, enchei-vos do que vos faz bem.
       Temos consciência que há situações das quais não conseguimos libertarmo-nos que não seja pela ajuda de outrem. Este Outro que vem até nós, e Se torna um de nós, para com Ele aprendermos a levantar o olhar, o coração e a vida, e a caminharmos mais seguros, ainda que entre tempestades!
       A ligação a Deus, pela oração confiante e pela obediência (escuta, respeito, amor) filial, liga-nos positivamente aos outros. Ou assim haveria de ser, se de facto a nossa união a Deus é genuína. Amamos o Pai amando os Seus filhos, o nosso semelhante.
       Esta certeza convoca-nos para transformarmos o mundo, a começar pela nossa casa. «Exulta de alegria, filha de Sião, solta brados de júbilo, filha de Jerusalém. Eis o teu Rei, justo e salvador, que vem ao teu encontro, humildemente montado num jumentinho, filho duma jumenta. Destruirá os carros de combate de Efraim e os cavalos de guerra de Jerusalém; e será quebrado o arco de guerra. Anunciará a paz às nações: o seu domínio irá de um mar ao outro mar e do Rio até aos confins da terra».
       O poder e a grandeza de Deus, garantia da justiça e da misericórdia, mostram-se pela humildade, pela pobreza de meios, revelando-Se na compaixão. "O Senhor é clemente e compassivo, paciente e cheio de bondade. O Senhor é bom para com todos e a sua misericórdia se estende a todas as criaturas" (Salmo).
       Tendo um chão seguro – Deus em nós –, há que trabalhar, meter as mãos à obra.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (ano A): Zac 9, 9-10; Sl 144 (145); Rom 8, 9. 11-13; Mt 11, 25-30.

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