sábado, 30 de agosto de 2014

XXII Domingo do Tempo Comum - ano A - 31 de agosto

       1 – E vós que dizeis que Eu sou? Pergunta essencial que Jesus nos faz sobre o testemunho que estamos dispostos a dar, identificando-nos com Ele e permitindo que Ele transpareça em nós, através de nós, diante de todas as pessoas que encontramos.
       Pedro, como víamos, responde também por nós. Tu és o Messias, o Filho de Deus. Isto é, não és um dos profetas, és o Messias de Deus, és único para mim. Seguir-Te-ei por onde fores.
       Tu és Pedro, pedra, sobre ti edificarei a minha Igreja. Recordava o nosso Bispo, D. António Couto, que aquela pedra, que é Pedro, é frágil, esburacada, alcofa, berço, para nele e através dele, e também em nós e através de nós, Cristo possa agir no mundo.
       A profissão de fé de Pedro é reveladora. Mas a consciência do que acaba de dizer parece não ter ainda a consistência do seguimento, a luz da fé que brotará com toda a força na Ressurreição de Jesus Cristo.
       O Mestre vai prevenindo os seus discípulos para que não se deixam iludir por facilidades. Ele é o Messias, o Enviado de Deus, mas não dispensa ninguém de trabalhar, de fazer o seu próprio caminho. Ele é Guia, mas não nos substitui os pés, a vontade. Teremos que viver a nossa vida, enfrentando os dias bons e os dias nebulosos. Ele estará sempre connosco. Sempre de mão estendida para não nos deixar afundar. Esta confiança que nos vem da fé ajuda-nos a encarar as intempéries que advirão pelo caminho.
       O Filho do Homem, que é também o Filho de Deus, vai sofrer. Vai passar as passas do Algarve, vai ser entregue às autoridades e será morto. No entanto, não há que se deixar afugentar pela morte, pois a ressurreição, três dias depois, trará a vitória do amor, da entrega, a vitória de Deus sobre o mal, a injustiça, o sofrimento.
       2 – Quando nos dão uma má notícia deixamos de ter disponibilidade para boas notícias. Os discípulos já não ouvem Jesus a falar de ressurreição e logo Pedro O contesta, dizendo: «Deus Te livre de tal, Senhor! Isso não há de acontecer!».
       Jesus volta-Se para Pedro e diz-lhe: «Vai-te daqui, Satanás. Tu és para mim uma ocasião de escândalo, pois não tens em vista as coisas de Deus, mas dos homens». E logo para todos os discípulos, que hoje somos nós: «Se alguém quiser seguir-Me, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-Me. Pois quem quiser salvar a sua vida há de perdê-la; mas quem perder a sua vida por minha causa, há de encontrá-la. Na verdade, que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder a sua vida? Que poderá dar o homem em troca da sua vida? O Filho do homem há de vir na glória de seu Pai, com os seus Anjos, e então dará a cada um segundo as suas obras».
       Aí estão as linhas de orientação para sermos verdadeiramente discípulos, seguidores de Jesus. Seguir atrás do Mestre. Quando queremos ir à frente, ou sem Jesus Cristo e o Seu Evangelho de amor e de perdão, corremos o risco de perder a vida em vão. É preciso sermos aquela pedra frágil cuja força nos vem do alto, de Jesus Cristo, pelo Espírito Santo. Precisamos de não impedir que Deus trabalhe em nós e através de nós. Podemos ter o mundo inteiro nas mãos, mas se nos faltar a caridade, faltar-nos-á a própria vida, como dom partilhável. Precisamos de GASTAR a vida a favor dos outros, a exemplo de Jesus que dá a vida pela humanidade inteira.
       3 – Há tantos caminhos quantas as pessoas. Resposta do então Cardeal Joseph Ratzinger, em Sal da Terra (1996), quando lhe perguntaram quantos caminhos havia para Jesus Cristo, lembrando que a própria Igreja é definida como caminho de Cristo. Ou Jesus, como único caminho que nos conduz ao Pai.
       Dito isto, facilmente se conclui que cada um é chamado a fazer o seu próprio caminho. Mas não estamos sós. A reprimenda dada a Pedro surge neste contexto. Se queremos passar à frente de Jesus ou prosseguir sem Ele, estaremos sob o domínio de Satanás, diabolizando a nossa ligação com os outros. Há que avançar seguindo Jesus, procurando orientar-nos pelas suas pegadas.
       No campo ou na cidade, os pais levam a criança pela mão. Ou, vão à frente (na vida), dando o exemplo pela palavra e pela postura. A criança larga a mão dos pais e pode perder-se se avança demasiado ou se se atrasa e deixa de os ver. Seguimos por um trilho, por entre giestas, arvoredo, e procuramos que os nossos pés pisem onde outros pisaram, ainda que as nossas pegadas sejam nossas. Será mais seguro, pois sabemos que aqueles que nos precederam trilharam caminhos que nos dão segurança, sem nos iludirmos no arvoredo, com o perigo de tropeçarmos numa pedra, ou cairmos em algum buraco, ou irmos diretos a uma ribanceira. Ainda que possamos retomar a caminhada.
       Cai neve que cobre por completo o chão que pisamos. Se alguém já passou, nós vamos prosseguindo sabendo onde podemos pisar com segurança. Deslocámo-nos por um caminho que desconhecemos. Nada melhor que uma bússola ou o GPS. Isto mesmo diz Jesus a Pedro. Afasta-te de Mim. Passa para trás. Eu Sou o alfa e o ómega, o Teu Norte. Vem por Mim e serás salvo. A minha Palavra é bússola para o teu peregrinar, o meu Evangelho é o melhor GPS para saberes para onde vais. Chega mais depressa não quem corre mais mas quem sabe para onde ir. Quem se mete em atalhos pode muito bem meter-se numa carga de trabalhos. Seguir no encalço de Jesus dá-nos a confiança para prosseguirmos com alegria, criatividade, segurança, sabendo que encontraremos dificuldades, mas sabendo também que o nosso olhar não se despegará do de Jesus.
       Por outro lado, o testemunho dos santos, ou de pessoas luminosas que vamos encontrando nas nossas comunidades, cuja vivência de compromisso com os irmãos, nos leva, ainda hoje, a descobri mais facilmente as pegadas de Jesus. Voltando ao exemplo anterior, seguindo um trilho, se outros forem decalcando as pegadas que encontram, tornam-se mais visíveis para nós.

       4 – São Paulo admoesta, ao jeito de Jesus, para que não nos conformemos com o tempo presente, com este mundo, com os nossos interesses, mas em tudo procuremos "o que é bom, o que Lhe é agradável, o que é perfeito", discernindo segundo a vontade de Deus.
       Se nos preocuparmos apenas connosco e com o nosso umbigo, conformar-nos-emos com o mundo, deixando-nos transformar por ele. Mas, seguindo Jesus, deveremos gastar a nossa vida para transformar o mundo, oferecendo-nos a nós "mesmos como sacrifício vivo, santo, agradável a Deus, como culto espiritual", sob o domínio da misericórdia de Deus. Vivamos à sombra das Suas asas (Salmo)!
       Esta é a nossa vocação: fazer com que o nosso caminho, seguindo a vontade de Deus, nos aproxime do caminho que é Jesus Cristo. Se nos faltarem as forças, não temamos pois a nossa vida está unida a Deus, cuja mão nos serve de amparo (Salmo).
       Jeremias sente, como Pedro, como Paulo, e como nós, o chamamento de Deus ao qual não pode virar costas, ou fazer de conta. O profeta reconhece as dificuldades do caminhos, mas sabe que não lhe cabe desistir: "Em todo o tempo sou objeto de escárnio, toda a gente se ri de mim; porque sempre que falo é para gritar e proclamar: «Violência e ruína!». E a palavra do Senhor tornou-se para mim ocasião permanente de insultos e zombarias. Então eu disse: «Não voltarei a falar n’Ele, não falarei mais em seu nome». Mas havia no meu coração um fogo ardente, comprimido dentro dos meus ossos. Procurava contê-lo, mas não podia".
       Por vezes pode ser mais fácil deixar andar, ao sabor do vento. Mas se Ele verdadeiramente nos seduziu, a Sua voz há de ressoar dentro de nós até ao Infinito. Mas também a Sua Mão nos guiará.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (ano A): Jer 20, 7-9; Sal 62 (63); 2 Rom 12, 1-2; Mt 16, 21-27.

Sem comentários:

Enviar um comentário