sábado, 27 de setembro de 2014

XXVI Domingo do tempo Comum - ano A - 28 de setembro

       1 – Deus chama. Chama-nos. Sempre. A qualquer hora da nossa vida. A todas as horas. Não desiste. Nunca desiste de nós. Não desiste de nos procurar. Não desiste do ser humano. Nunca. Procura-nos. Vem ao nosso encontro. Não. Não apenas vem ao nosso encontro. Faz-Se um de nós. Assume-nos. Por inteiro. Como inteiro é o Seu amor por nós. Em Jesus Cristo, Deus entra na história. Torna-Se carne da nossa carne, osso dos nossos ossos.
"Ele, que era de condição divina, não Se valeu da sua igualdade com Deus, mas aniquilou-Se a Si próprio. Assumindo a condição de servo, tornou-Se semelhante aos homens. Aparecendo como homem, humilhou-Se ainda mais, obedecendo até à morte, e morte de cruz".
       Poderíamos pensar que vinha apenas para os que O conheciam há mais tempo. Ou para um grupo de iluminados. Ou que viria para os puros, os sãos, os santos. Mas não. Não. Deus vem para todos. Primeiramente, Deus vem para os pequeninos, para os pecadores, para os excluídos, para os que têm pouco ou nada têm. Presunção e água benta cada um toma a que quer. Mas é a presunção que nos afasta de Deus. Se nos colocamos acima dos outros, corremos o risco, o sério risco, de perdermos Deus de vista. E porquê? Porque Ele está e encontra-Se sobretudo nos mais desvalidos. Ele escondeu-Se e continua escondido no ser humano, até naquele que nós odiamos ou contra quem temos razões de sobra para odiar.
       A benevolência de Jesus só esbate com a hipocrisia, a incoerência, a duplicidade.
       A misericórdia que Jesus mostra não enjeita ninguém. Se O queremos ver é junto dos excluídos. Onde está a escumalha da sociedade ou as pessoas que não contam – leprosos, coxos, cegos, publicanos, mulheres de má vida, pecadores públicos, estrangeiros, crianças, mulheres, viúvas, pobres – aí O encontramos. Não tem telefone. Nem caixa de correio. É aí que O encontramos, onde ninguém vai em segurança, onde ninguém vai sem se incomodar. Obviamente que podemos encontrá-l'O em nossa casa, no nosso coração. A condição social, económica, cultural, religiosa, não é entrave para Jesus. Centurião, oficial do exército romano. Simão, um fariseu bem na vida. Nicodemos, ilustre doutor da Lei. Ele está onde é mais preciso. Jesus está onde O querem e onde O deixam estar. A prioridade não exclui ninguém. A prioridade de Jesus são os pobres. Na hora de cuidar, de prestar atenção, de Se misturar, é com eles que Ele Se quer. E nós?
       2 – Segunda parábola de Jesus tendo como pano de fundo a vinha.
       Lá está a multidão. Na primeira fila, os príncipes dos sacerdotes e os anciãos do povo. Os que sabem mais. Os que (aparentemente) sabem tudo e que têm o poder em mãos: «Que vos parece? Um homem tinha dois filhos. Foi ter com o primeiro e disse-lhe: ‘Filho, vai hoje trabalhar na vinha’. Mas ele respondeu-lhe: ‘Não quero’. Depois, porém, arrependeu-se e foi. O homem dirigiu-se ao segundo filho e falou-lhe do mesmo modo. Ele respondeu: ‘Eu vou, Senhor’. Mas de facto não foi. Qual dos dois fez a vontade ao pai?». Prontamente Lhe respondem, convictos e resolutamente: «O primeiro».
       Cumpre a vontade do Pai não aquele que Lhe diz sim com os lábios, negando-O com a vida, mas todo aquele que, mesmo errando, procura corrigir o seu caminho, ajuda os outros, insiste no bem, na verdade, aproximando-se da justiça, é exigente consigo e tolerante com os outros, não se coloca acima, e solidariamente estende as mãos, o coração e a vida para os outros.
       E logo Jesus acrescenta, para o caso de haver dúvidas: «Em verdade vos digo: Os publicanos e as mulheres de má vida irão diante de vós para o reino de Deus. João Baptista veio até vós, ensinando-vos o caminho da justiça, e não acreditastes nele; mas os publicanos e as mulheres de má vida acreditaram. E vós, que bem o vistes, não vos arrependestes, acreditando nele».
       Lá voltamos nós! Não importa a origem, a condição social, ou até a religião, não importa a riqueza ou a pobreza, não importa se somos cidadãos nativos ou estrangeiros, homens ou mulheres, não importa como chegamos aqui. Então o que importa? Um coração disposto a segui-l'O. Eis que o Mestre está a chamar! Como Lhe respondemos? Vamos dizendo sim, conforme o vento? Ou tentamos cada dia estarmos mais parecidos com Ele?

       3 – Por mais que a nossa mente esteja esclarecida e sábio seja o nosso coração, a grandeza do amor de Deus supera-nos. Vai além de todos os cálculos que possamos fazer. Como poderemos entender que Ele seja como o dono da vinha, que paga a todos dando TUDO a todos. Os últimos recebem nada menos que o próprio Deus, o seu reino de Amor.
       Através de Ezequiel, diz-nos o Senhor: «Vós dizeis: ‘A maneira de proceder do Senhor não é justa’. Escutai, casa de Israel: Será a minha maneira de proceder que não é justa? Não será antes o vosso modo de proceder que é injusto?».
       Nunca nos passará pela cabeça a imensidão e alcance da bondade e da misericórdia de Deus. A nossa concepção de justiça limita-nos na capacidade de sermos compassivos.
       Na dúvida, quando andarmos perdidos, quando nos assaltar o medo, voltemos o nosso coração, o nosso olhar, a nossa vida para Deus:
"Mostrai-me, Senhor, os vossos caminhos, ensinai-me as vossas veredas. Guiai-me na vossa verdade e ensinai-me, porque Vós sois Deus, meu Salvador: em vós espero sempre. Lembrai-Vos, Senhor, das vossas misericórdias e das vossas graças que são eternas. Não recordeis as minhas faltas e os pecados da minha juventude. Lembrai-Vos de mim segundo a vossa clemência, por causa da vossa bondade, Senhor".
       Deixemo-nos guiar por Ele, pelo Seu amor infinito. Ele não nos faltará.
       4 – Seguir Jesus, trabalhar na vinha do Senhor, implica, antes de mais, a identificação com Ele – "Para mim viver é Cristo". O Apóstolo Paulo, como escutávamos na semana passada, di-lo claramente, sublinhando que essa identificação o atrai para a eternidade, para a glória de Deus, junto de Jesus, mas, simultaneamente, o compromete com a Sua vinha, anunciando o Evangelho.
       Hoje, na mesma carta aos Filipenses, o Apóstolo fala-nos como Jesus nos precede, identificando-Se connosco. Ele que era de condição divina, fez-Se servo por nossa causa. Agora é tempo de nós nos identificarmos com Ele, procurando em tudo ser fiéis aos Seus ensinamentos.
       Trabalhar na vinha do Senhor. Seguir os Seus caminhos. Viver os Seus mandamentos. Alimentar-nos da Sua vida. Acolher a Sua vontade. Procurarmos ser como Ele. Significa também, inevitavelmente, procurarmos a unidade, a comunhão com todos. Se estamos ligados a Cristo, teremos de estar ligados aos irmãos de Cristo, que nossos irmãos são. Como uma fiada de luzes em série, como nas luzes de Natal, falha uma, todas falham, ou falham daí para a frente.
       Escutemos atentamente o Apóstolo:
"Se há em Cristo alguma consolação, algum conforto na caridade, se existe alguma comunhão no Espírito, alguns sentimentos de ternura e misericórdia, então completai a minha alegria, tendo entre vós os mesmos sentimentos e a mesma caridade, numa só alma e num só coração. Não façais nada por rivalidade nem por vanglória; mas, com humildade, considerai os outros superiores a vós mesmos, sem olhar cada um aos seus próprios interesses, mas aos interesses dos outros. Tende em vós os mesmos sentimentos que havia em Cristo Jesus".
Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia: Ez 18, 25-28; Sl 24 (25); Filip 2, 1-11; Mt 21, 28-32.

Sem comentários:

Enviar um comentário